pois é... voltei!
não to conseguindo encontrar tempo nessa nova rotina pra me dedicar ao blog. mas não deixo de pensar nele no fim do dia, quando toda loucura fica pra trás e eu posso enfim sentar na frente dessa máquina. só que o cansaço é tamanho, que não consigo sequer começar a escrever qualquer coisa que seja... e como não quero escrever por escrever (acho que já falei isso aqui), prefiro encontrar um tempinho, mesmo que seja no finzinho do final de semana, pra escrever pra vocês.
como dito no post: "então tá, vamos falar de amor... e poesia.", hoje trago o segundo mal amado de joão cabral de melo neto... com vocês, palavras de raimundo:
"maria era a praia que eu frequentava certas manhãs. meus gestos indispensáveis que se cumpriam a um ar tão absolutamente livre que ele mesmo determina seus limites, meus gestos simplificados diante de extensões de que uma luz geral aboliu todos os segredos.
maria era sempre uma praia, lugar onde me sinto exato e nítido como uma pedra - meu particular, minha fuga, meu excesso imediatamente evaporados. maria era o mar dessa praia, sem mistério e sem profundeza. elementar, como as que podem ser mudadas em vapor ou poeira.
maria era também uma fonte. o líquido que começaria a jorrar num momento que eu previa, num ponto que eu poderia examinar, em circunstâncias que eu poderia controlar. eu aspirava acompanhar com os olhos o crescimento de um arbusto, o surgimento de um jorro de água.
maria era um copo vago, impreciso. eu estava ciente de todos os detalhes de seu corpo, que poderia reconstruir à minha vontade. sua boca, seu riso irregular. todos esses detalhes não me seria difícil arrumá-los, recompondo-a, como num jogo de armar ou uma prancha anatômica.
maria era também, em certas tardes, o campo cimentado que eu atravessava para chegar em algum lugar. sozinho sobre a terra e sob um sol que me poderia evaporar de toda nuvem.
maria era também uma árvore. um desses organismos sólidos e práticos, presos à terra com raízes que exploram e devassam seus segredos. e ao mesmo tempo lançadas para o céu, com quem permutam seus gases, seus pássaros, seus movimentos.
maria era também uma garrafa de aguardente. aproximo o ouvido dessa forma correta e explorável e percebo o rumor e os movimentos de sonhos possíveis, ainda em sua matéria líquida, sonhos de que disporei, que submeteria a meu tempo e minha vontade, que alcançarei com a mão.
maria era também o jornal. o mundo ainda quente, em sua última edição e mais recente.
maria era também um livro: susto de que estamos certos, susto que praticar, com que fazer os exercícios que nos permitirão entender a voz de uma cadeira, de uma cômoda, susto cuidadosamente oculto, como qualquer animal venenoso entre folhas claras e organizadas dessa floresta numerada que leva dísticos explicativos: poesia, poema, versos.
maria era também a folha em branco, barreira oposta ao rio impreciso que corre em regiões de alguma parte de nós mesmos. nessa folha eu construirei um objeto sólido que depois imitarei, o qual depois me definirá. penso para escolher: um poema, um desenho, em cimento armado - presenças precisas e inalteráveis, opostas a minha fuga.
maria era também o sistema estabelecido de antemão, o fim onde chegar. era a lucidez, que, ela só, nos pode dar um modo novo e completo de ver uma flor, de ler um verso."
e nada faria sentido sem o amor. sem aspas.
raimundo não inspira o mesmo sentido de amor que joaquim, aquele amor sofredor, que mata de tanto que dói. que SE mata de tanto que dói. mas inspira a mesma intensidade. um amor distante e próximo, íntimo e desconhecido... um amor solitário.
na verdade, joaquim é o terceiro mal amado. portanto, quando eu voltar a dissertar sobre esta genialidade de joão cabral de melo neto, volto com o primeiro dos mal amados mais os três mal amados na versão de carlos drummond de andrade.
amor, minha gente. até a próxima.
marmper
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